terça-feira, 28 de abril de 2015

CITAÇÃO




"Nem sempre é necessário tornar-se forte.
Temos que respeitar nossas fraquezas.
Então, são lágrimas suaves, de uma tristeza
legítima à qual temos direito.
Elas correm devagar e quando passam pelos
lábios sente-se aquele gosto pouco salgado,
produto de nossa dor
mais profunda."


Clarice Lispector

segunda-feira, 27 de abril de 2015

DA REALIDADE


Arte de Egidio Antonaccio


Que renda fez a tarde no jardim,
Que há cedros que parecem de enxoval?
Como é difícil ver o natural
Quando a hora não quer!
Ah! Não digas que não ao que os teus olhos
Colham nos dias de irrealidade.
Tudo então é verdade,
Toda a rama parece
Um tecido que tece
A eternidade.

Miguel Torga
In: Antologia Poética

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Às VEZES TUDO SE ILUMINA




“Às vezes tudo se ilumina de uma intensa irrealidade
E é como se agora este pobre, este único,
este efêmero instante do mundo
Estivesse pintado numa tela, 
Sempre”...

Mario Quintana ,
in A Cor do Invisível

quarta-feira, 22 de abril de 2015

NÃO DEIXES




Não deixes que termine o dia sem teres crescido um pouco, 
sem teres sido feliz, sem teres aumentado os teus sonhos. 
Não te deixes vencer pelo desalento. 
Não permitas que alguém retire o direito de te expressares, 
que é quase um dever. 
Não abandones as ânsias de fazer da tua vida algo extraordinário. 
Não deixes de acreditar que as palavras e a poesia podem mudar
o mundo. 
Aconteça o que acontecer a nossa essência ficará intacta. 
Somos seres cheios de paixão. 
A vida é deserto e oásis. 
Derruba-nos, ensina-nos, converte-nos em protagonistas de
nossa própria história. 
Ainda que o vento sopre contra, a poderosa obra continua: 
tu podes tocar uma estrofe. 
Não deixes nunca de sonhar, porque os sonhos tornam 
o homem livre.


Walt Whitman
(31 de maio de 1819- 26 de março de 1892)

domingo, 19 de abril de 2015

NA VÉSPERA DE NÃO PARTIR NUNCA...





Na véspera de não partir nunca 
Ao menos não há que arrumar malas 
Nem que fazer planos em papel, 
Com acompanhamento involuntário de esquecimentos, 
Para o partir ainda livre do dia seguinte. 

Não há que fazer nada 
Na véspera de não partir nunca. 

Grande sossego de já não haver sequer de que ter sossego! 
Grande tranquilidade a que nem sabe encolher ombros 
Por isto tudo, ter pensado o tudo 
É o ter chegado deliberadamente a nada. 

Grande alegria de não ter precisão de ser alegre, 
Como uma oportunidade virada do avesso. 

Há quantas vezes vivo 
A vida vegetativa do pensamento! 
Todos os dias sine linea 
Sossego, sim, sossego... 
Grande tranquilidade... 

Que repouso, depois de tantas viagens, físicas e psíquicas! 
Que prazer olhar para as malas fítando como para nada! 
Dormita, alma, dormita! 
Aproveita, dormita! 
Dormita! 

É pouco o tempo que tens! Dormita! 
É a véspera de não partir nunca! 

 
 Álvaro de Campos,
 in "Poemas" 
Heterónimo de Fernando Pessoa
 


A POESIA



"A poesia é o instrumento mais generoso para eliminar a 
solidão, a indiferença, o desencanto, o cinismo e a 
discri- minação.
A solidão vale como espaço para refletir em profundidade 
sobre nosso destino comum e a ausência de solidariedade
que desequilibra o sistema social, acentua privilégios 
e exclusões.
Se o poema, muitas vezes, amadurece sem terras, em solidão,
sua existência (resistência) se justifica para lembrar 
que o ser humano mais uma vez não é ilha, mas partilha."

Lindolf Bell


sábado, 18 de abril de 2015

FILHAS DO OUTONO




As folhas afogam
a foice do tronco cortado.

As folhas sabem
da face do plano amargo.

Sabem, as folhas,
das rimas torpes e pobres.

Sabem, as folhas,
das manhas, serras e dramas.

As folhas, caindo, afogam
o Tempo que engole a História!



Jairo De Britto,
em "Dunas de Marfim"




quinta-feira, 16 de abril de 2015

ALGUMAS PALAVRAS...




"Algumas palavras. Poucas.
Ditas como por acaso.
Não propriamente ditas.
Só pressentidas Como folhas verdes .
Um verde, digamos, brilhante.
De laranjeiras.
Foi como se de repente
chovesse: 
as folhas, quero dizer, as palavras brilharam. 
Não que fossem ditas,
mas eram de amor, embora só adivinhadas.
Por isso, brilhavam. 
Como folhas ,molhadas. "

Eugênio de Andrade


domingo, 12 de abril de 2015

CEREJEIRA EM FLOR




Acordar, ser na manhã de Abril
a brancura desta cerejeira;
arder das folhas à raiz,
dar versos ou florir desta maneira.

Abrir os braços, acolher nos ramos
o vento, a luz, ou o quer que seja;
sentir o tempo, fibra a fibra,
a tecer o coração de uma cereja.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, 10 de abril de 2015

quinta-feira, 9 de abril de 2015

TEM DE SER EQUILIBRISTA...




"Tem de ser equilibrista até o final. E suando muito,
 apertando o cabo da sombrinha aberta, com medo de cair,
 olhando a distância do arame ainda a percorrer
 - e sempre exibindo para o público um falso sorriso
 de serenidade. Tem de fazer isso todos os dias,
 para os outros, como se na vida você não tivesse
 feito outra coisa, para você como se fosse a 
 primeira vez, e a mais perigosa. Do contrário, 
 seu número será um fracasso."


Fernando Sabino

segunda-feira, 6 de abril de 2015

VIII



Não te iludas, amigo, não te iludas
se os livros graves em que tanto estudas
te dão a crença de que és mestre e sábio.
A verdadeira e sã filosofia
não reside na tua fantasia,
mas no silêncio que te fecha o lábio.


Alfredo Cumplido de Sant'Anna
in Poemas e Legendas


quarta-feira, 1 de abril de 2015

INSCRIÇÃO PARA UMA CABANA




O caminho dos simples coberto de musgo vermelho
A janela na montanha abrindo para o azul
Invejo-te o vinho que bebes entre as flores
e todas essas borboletas que voam nos teus sonhos.

Tsian Ki (722-780)
Trad.: Jorge de Sousa Braga