domingo, 2 de março de 2014

UM CAMINHO DE PALAVRAS



Tudo o que sei, já lá está, mas não estão os meus
passos nem os meus braços. Por isso caminho,
caminho, porque há um intervalo entre tudo e
eu, e nesse intervalo caminho e descubro o meu caminho.

Mas entre mim e os meus passos há um intervalo
também: então invento os meus passos e o meu próprio
caminho. E com as palavras de vento e de pedras,
invento o vento e as pedras, caminho um caminho de palavras.

Caminho um caminho de palavras
(porque me deram o sol)
e por esse caminho me ligo ao sol
e pelo sol me ligo a mim

E porque a noite não tem limites
alargo o dia e faço-me dia
e faço-me sol porque o sol existe

Mas a noite existe
e a palavra sabe-o.

António Ramos Rosa,
in "Sobre o Rosto da Terra"




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