segunda-feira, 15 de setembro de 2014

MÍMICA POÉTICA



Dizer não tudo, que isso não se faz,
nem nada, o que seria impossível;
dizer apenas tudo que é demais
pra se calar e menos que indizível.

Dizer apenas o que não dizer
seria uma espécie de mentira:
falar, não por falar, mas para viver,
falar (ou escrever) como quem respira.

Dizer apenas o que não repita
a textura do mundo esvaziado:
escrever, sim, mas escrever com tinta;
pintar, mas não como aquele que pinta
de branco o muro que já foi caiado;
escrever, sim, mas como quem grafita."

Paulo Henriques Britto,

in Mínima lírica, 1989


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